quinta-feira, 15 de maio de 2014

Especial Titãs #7 - Resenha #9: Titãs - Nheengatu

Depois de muita espera, saiu o disco novo dos Titãs. E com ele, voltou o respeito pela banda. Como dito exaustivamente nas últimas seis postagens, a banda estava em um período coxinha de sua história desde o Acústico MTV até o lançamento do Sacos Plásticos. Após isso, a saída de Charles da banda e, segundo eles, "a experiência de tocar o Cabeça Dinossauro na íntegra ao vivo" deram uma balançada nas coisas, e a banda enveredou pelo lado mais pesado novamente.

Nheengatu soa quase como um disco conceitual. Muitas letras de teor pesado, críticas, ácidas, que variam desde a chegada dos portugueses do Brasil até os dias atuais, protestos e abuso de poder das forças policiais. Aliás, tema muito bem retratado na música que abre o disco, Fardado. Pesada, com uma estrutura semelhante com Será que É Isso que Eu Necessito? (em relação a estrofes e refrões), faixa de abertura do Titanomaquia, de 1993. Fardado também é cantada por Sérgio Britto, que predomina nos vocais durante do disco. São seis músicas cantadas por ele, contra quatro de Miklos e quatro de Branco. Além da faixa de abertura, outras três não foram tocadas durante a turnê do Titãs Inédito: Cadáver Sobre Cadáver, Pedofilia e o belo cover da banda para Canalha, de Walter Franco.

Versão picareta especial de Nheengatu
Seguindo no disco, temos Mensageiro da Desgraça. Não me cativou como as outras, mas é uma boa música. Um pouco mais difícil de assimilar, assim como as outras músicas cantadas pelo Miklos. As letras dele, em geral, são mais metafóricas e reflexivas, diferente das do Sérgio, que são mais "dedo na cara" e as do Branco, que brincam sempre com contradição e descrição. República dos Bananas, terceira música do disco, é um bom exemplo. Ao longo da letra, Branco nos relata situações cotidianas das pessoas que compõem as "bundas e caras da República dos Bananas". Um ska, mais pesado que um ska comum, mas mais leve do que as duas primeiras músicas.

A quarta música do disco é uma velha conhecida dos frequentadores dos shows da banda. Fala, Renata, com uma letra incrivelmente simples, pode ser interpretada como uma crítica à futilidade das conversas das pessoas. Pesada em sua essência, tem uma seção no meio de um solinho de teclado onde a levada lembra até um, sei lá, forró. Não é das minhas preferidas, mas é legalzinha até.

Após Fala, Renata, temos a sequência de músicas que eram desconhecidas do público. Cadáver Sobre Cadáver apresenta uma parceria de Miklos com... Arnaldo Antunes na composição. Sim, até hoje a banda visita Arnaldo pra fazer umas músicas junto com ele. E se pararmos pra pensar, é a música que tem a cara dele mesmo. A letra é cheia de jogos de palavras. Confesso que não gostei muito na primeira audição, e é uma das mais "estranhas" pro meu ouvido, porque ela é bem engessada, sempre com o mesmo andamento, parecendo mais um cântico de protesto. Mas é inegável o valor crítico de sua letra.

Diferentemente das músicas do Miklos, as do Branco estão sensacionais. Retas, fáceis de assimilar, confesso que me surpreenderam. Canalha, apesar de ser apenas um cover de Walter Franco, ficou muito boa. Pesada, dá um tempo na loucura do começo do disco, por ser mais arrastada. Além disso, o teclado do Britto ficou com um quê de No Quarter, dando um toque muito afudê pra música. Forte candidata a uma das melhores do disco. E ainda bem que ela está ali, sexta música, porque logo depois vem Pedofilia.

Pedofilia tem uma pegada ao melhor estilo Tudo Ao Mesmo Tempo Agora. Suja, agressiva, talvez a letra mais pesada do disco, mostrando a visão "da criança" (claro, com a interpretação do adulto sobre o depois da situação). Sem falar na ponte no meio, só baixo e o tecladinho sinistro. Logo após, temos Chegada ao Brasil (Terra à Vista). Pra quem foi no show, era só Terra à Vista. Fiel ao arranjo original, também é uma das melhores do disco. Reta, pesada e com um trava língua no refrão, que inclusive o Branco errava às vezes nos shows.

Eu Me Sinto Bem é a nona música do disco. Música que abriu os shows do Titãs Inédito, é um ska mais leve também, apesar de bem acelerado. Aqui, Sérgio critica, talvez, a comodidade das pessoas, de simplesmente se sentirem bem em não ter nada para fazer. Seguindo, Flores Pra Ela. Me lembro que quando Miklos anunciou ela no show aqui em Porto Alegre, o pessoal vibrou, achando que era Flores, e era bote. Flores Pra Ela também tem um teor bem ácido na letra. Começa levezinha no instrumental, e depois o pau come solto. E mostra uma relação patriarcal, onde ele manda e desmanda nela e ela aceita. Uma crítica ao machismo? Provavelmente. O solo do Bellotto tá bem legal nessa.

Entrando na reta final do disco, Não Pode. Sérgio, direto como sempre, criticando as supostas "regras de comportamento" na sociedade. O instrumental é muito bom, um dos melhores do disco. Senhor, que vem logo depois, critica a igreja. Tem gente que acha que a música lembra Igreja, do clássico Cabeça Dinossauro. Não vejo por esse lado. A letra é bem mais leve, encarando o lado dos medos que colocam em nossas cabeças, diferente de Nando, que já manda direto um "eu não gosto de madre/não gosto de padre/não gosto de frei". Parece uma crítica melhor construída. Baião de Dois é a penúltima música. Não gostei dela no show e continuo sem gostar muito no disco, ainda que tenham dado uma melhorada no arranjo dela. Sei lá, ela me soa meio vazia ainda. Talvez eu acabe me acostumando.

Pra fechar, Quem São os Animais?, uma música que até parece mais leve que as outras 13, mas a letra mostra um tema atual como nunca. Racismo, homofobia, preconceitos em geral, proferidos pelos ditos seres "racionais"... no fim a gente para e pensa, quem são os animais? Uma das melhores do disco também, e não lembrava que o instrumental dela era bom assim.

Fazendo um apanhado geral, Nheengatu tá mais pra um Titanomaquia com Domingo do que pra Cabeça Dinossauro com Õ Blésq Blom, como a banda disse. De Blésq esse disco não tem nada, é porrada o tempo todo. Aliás, qual não foi minha satisfação quando o Sérgio respondeu isso pra uma mina no Twitter dele. Ela perguntou se teria algo mais suave e intimista no disco e ele "não, só tem porrada".
Nheengatu é isso, é porrada, letras pra fazer a gente pensar. Digo que ele tem uma mescla de Domingo na receita porque, obviamente, algumas músicas são inferiores e talvez caiam no esquecimento, mas no geral, Titãs como não se via há muito tempo. Mesmo com metade do time, mostraram que o pulso ainda pulsa.


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